28 Sep
28Sep

Descobri, quase por acaso, uma frase que dizia: “a linguagem de amor de um artista é transformar você em arte.” E talvez tenha sido isso que sempre fiz, mesmo sem perceber, recolher pedaços de histórias, sentimentos inacabados, gestos interrompidos e dar a eles um lugar no papel.
É como se eu tivesse um ofício secreto: reescrever. Reenquadrar as situações sob novas luzes. Imaginar finais que nunca aconteceram, começos que poderiam ter existido, versões alternativas de um mesmo encontro. A vida me dá um esboço e eu invento suas variações.
E desse exercício nasceu algo novo: uma narrativa delicada, que não pertence inteiramente ao real nem à fantasia. É como uma invenção bonita do que não aconteceu, mas que ainda assim pulsa com verdade.
Quero deixar que essa história exista, que ocupe um espaço no mundo, porque gostei do resultado. E talvez você também encontre, nos fragmentos dela, um reflexo dos seus próprios quase-amores (ou amores que foram inteiros em suas partes), das suas pausas, dos seus desfechos suspensos.
Assim começa o romance: com uma cena roubada ao acaso da vida, mas devolvida em forma de arte porque talvez essa seja a minha linguagem do amor.
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O celular vibrou no meio da tarde, sem anúncio, sem contexto:

ele:
tem um livro seu aqui em casa.

Ela leu devagar, assustada e surpresa. Como quem decifra um bilhete esquecido no bolso. Ficou em silêncio por alguns minutos, pesando entre responder ou fingir que não era com ela. Mas respondeu, com a coragem doce de quem não perde a chance de brincar:

ela:
se você vier morar aqui, vai ter muito mais.Ele riu. Riu real, mas não entendeu direito.
ele:
preciso te devolver...
ela:
amanhã, 10h no parque. eu levo uns sanduíches de presunto e queijo e café. você leva umas frutas e suco (meu favorito é pink lemonade, by the way). você leva um livro, eu levo um livro. deito no seu colo e a gente lê...
ele:
o que é isso, um date?
ela:
não. um piquenique.
ele:
um picnic date.
ela:
vamos descobrir...
ele:
como assim?
ela:
se você sentir vontade de me beijar, é um date. se não, é só um rolê entre amigos.

Dava pra sentir o silêncio, apesar de ser só uma troca de mensagens...

ele:
huahuahuahua então é um date!
ela:
já tá com vontade de me beijar?
ele:
sim!
ela:
fucks! você estragou toda a magia do rolê.
ele:
huahuahua desculpa. é difícil não querer...
ela:
faz assim: eu finjo que não li as últimas mensagens, e amanhã a gente se surpreende sem querer.

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