Ele empurra o carrinho devagar, como quem não tem pressa, mas também não sabe exatamente o que está fazendo ali. No fundo, a playlist do mercado toca uma versão instrumental de uma música romântica que ele reconhece, mas finge não saber.
Ele para na seção de sucos. Olha prateleiras inteiras: morango com banana, laranja com cenoura, uva, abacaxi com hortelã... mas pink lemonade, nada.
Pega uma garrafinha, confere o rótulo, devolve. Faz isso com umas cinco.
Suspira.
Pensa: “Claro que justo o suco que ela gosta ia estar em falta... claro.”
Fica ali parado, olhando os sabores, como se alguma resposta fosse aparecer no rótulo.
O celular está no bolso. Ele hesita. Pega. Desbloqueia. Abre a conversa.
Digita: “Não tem pink lemonade. Tem outro que você goste?”
Apaga.
Digita de novo: “Posso levar de uva ou de pêssego. Ou levo os dois. Você escolhe amanhã.”
Apaga de novo.
Olha para cima. Respira fundo. Fala meio alto, como quem confessa para si mesmo:
“Mano, é só um suco.”
Mas sabe que não é.
Acaba pegando o de uva, clássico, seguro, e o de pêssego, doce, diferente.
“Talvez ela goste, sei lá.” Coloca os dois no carrinho.
Na parte das frutas, a mesma cena: fica encarando as opções como se fossem difíceis demais.
Bananas maduras demais. Morangos meio amassados.
Pega uvas. Solta. Pega de novo. Coloca no saquinho.
Pensa se ela gosta de manga. Pega uma. Cheira. Sorri.
O pensamento escapa: “Ela ia rir de mim agora.”
Na fila do caixa, ele já não pensa em suco nem em frutas.
Só nela, de vestido, deitada na grama, lendo com a cabeça no colo dele.
O riso leve, a boca perto demais... e o livro no meio dos dois.