Recentemente eu tenho pensado muito em como algumas ações são tão importantes para reparar as relações. Erros existem, isso é fato. Vamos, inevitavelmente, machucar pessoas (algumas de quem gostamos muito, inclusive). No entanto, a ação, de reparar exige uma intenção honesta e forte: a de admitir que o erro aconteceu. E, sobretudo, o desejo honesto de que aquilo não se repita. Mas reparação parece ser permeada por outras questões, como a importância e a relevância da outra pessoa na nossa vida e também a nossa capacidade genuína de nos vulnerabilizar.
Admitir erros e ter a coragem para reparar é de certa forma nos colocar nesse lugar de imperfeição. E admitir isso não é nada simples. Acontece que tem dias em que ser forte cansa. A gente veste a armadura, ergue o queixo, organiza as palavras para não tremer a voz e mesmo assim, lá dentro, uma parte de nós se sente pequena. Talvez Brené Brown chamasse isso de “o custo da armadura”: a tentativa de parecer inteiro enquanto o coração pede colo.
Foi ela quem me ensinou que vulnerabilidade não é fraqueza, mas "coragem em estado bruto". Que admitir “eu preciso de ajuda” ou “eu errei com você” é abrir uma porta (bonita) na relação com o outro. Um outro que é importante pra nós. Em A Coragem de Ser Imperfeito, Brené fala sobre o convite silencioso que existe nessa entrega. Quando alguém ousa mostrar as próprias cicatrizes/medos/vacilos/dúvidas, nos dá permissão para que também possamos nos relacionar sem máscaras. E isso é o mais leve que possamos ser com o outro: nós mesmos.
Lembro de uma frase de A Arte da Imperfeição, onde Brené nos provoca a trocar a busca exaustiva por aprovação pelo simples ato de viver com autenticidade. Esse é um chamado para quem passou a vida toda tentando dar conta de tudo, sem nunca pedir um abraço, sempre escondendo os erros, sempre engolindo a culpa e a vergonha. Olho ao redor e percebo que somos uma geração treinada para parecer forte e perfeita, e extremamente faminta por conexões reais. Nos stories, vidas editadas; nas conversas, risadas vazias. E, no entanto, o que nos cura é justamente o oposto: o gesto cru, a confissão sem ensaio, a lágrima que escapa. Eu sinto saudade de gente de verdade. Que erra, mas volta atrás, que repara. Que se engana, vez ou outra. Que tenta acertar. Que reconhece. Que pede colo, que quer abraço. Que diz que tá exausto de performar o que não é.
Brené Brown diz que vulnerabilidade é o berço da empatia, da criatividade, do amor. Sem ela, ficamos apenas competentes, produtivos, corretos, mas nunca inteiros. Talvez seja hora de nos permitir um pouco mais de imperfeição. Por baixo da armadura somos todos feitos da mesma matéria: medo, desejo, alegria, tristeza. Tonalidades que nos tornam humanos únicos.
Podemos nos proteger sob a redoma de vidro que criamos ao longo da vida. Mas assim jamais tocaremos verdadeiramente o outro. Justamente o outro, aquele que oferece o colo e o descanso que precisamos para curar as dores que nos impediram de ser inteiros. Talvez seja hora de, com calma, sair um pouco dessa redoma. De atravessar o medo e o orgulho, e nos permitir ser vistos de verdade. Porque o outro assusta, sim, ele pode nos ferir. Mas também pode ser um outro que ama. E o amor… o amor cura.