Há dias em que sentir demais me desalinha do mundo. Em que as palavras pesam, entalam, não saem, ou quando saem, não dizem tudo. Nesses momentos, a poesia me encontra. Não como resposta, mas como abrigo. Como bem disse Lacan, “todo uso da linguagem se desloca na metáfora”, e é nesse deslocamento que eu respiro. A metáfora me permite existir quando a realidade parece demais. A poesia acolhe o que eu não sei dizer diretamente; traduz minhas emoções sem me cobrar explicações. Ela me salva de mim mesma, das armadilhas que crio, dos silêncios que aprendi a carregar. Me recolhe quando estou em pedaços e me devolve a mim, mesmo que em fragmentos. Porque, no fundo, é ali, na entrelinha do que escrevo, que ainda insisto em ser vista.
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a poesia me salva
de mim mesma,
dos medos que crio,
do escuro nos olhos
de quem escolhe
não me ver.
a poesia me salva
da raiva disfarçada
de sinceridade crua.
me devolve pra mim
quando sinto demais
e o peito não comporta.
a poesia me acolhe
quando o grito
não pode sair,
porque aprendi a ser
boa demais,
educada demais,
polida demais.
ela me ampara
nos dias cinzas
com cara de sol,
na alegria ensaiada
e no choro escondido.
a poesia me salva
quando alguém me lê
e me enxerga nas entrelinhas
do que não digo.
naquilo que só ela sabe:
que, às vezes,
eu só preciso
ser salva de mim.